22/06/2009
Anedota no metrô
Estava no horário de pico, então dá para se imaginar o furdunço no local.
Pessoas correndo, descendo desordenadamente as escadas, cruzando umas com as outras sem nem menos se perceberem, tudo isso como se aquele fosse o último metrô a passar naquele horário.
Alguns tentam convencer os funcionários do metrô a deixá-los passar gratuitamente, cada um com uma conversa diferente, mas todos com o mesmo problema: o dinheiro acabou, o dinheiro sumiu, o dinheiro se perdeu, o dinheiro foi esquecido não sei aonde.
Enquanto isso, bem ao meu lado passou pela catraca um homem alto, jovem e bem arrumado. Ele estava de óculos escuros e usava uma bengala para cegos. De braços dados com ele estava um funcionário do metrô, que foi guiando-o em direção às escadas, até que subitamente o rapaz fez um sinal para o funcionário parar. Fiquei observando para entender do que se tratava. Depois de uma breve troca de palavras, o funcionário simplesmente o largou ali, próximo à sala de supervisão operacional da estação.
O rapaz ficou no mesmo lugar por alguns longos minutos, sem dar nenhum passo sequer. Desviei então a minha atenção para outras curiosidades que uma estação de metrô pode oferecer num horário como este.
Mas não foi por muito tempo. Olhando para uma das escadas que dão acesso ao metrô, vi surgir uma jovem muito bonita, bem vestida e usando óculos escuros. Ela vinha de braços dados com outra pessoa, que a trouxe para bem perto da sala operacional da estação.
O jovem, que estava ali parado havia alguns minutos, estava a dois passos de distância dela. E os dois permaneceram estáticos, um ao lado do outro, “olhando” para a mesma direção.
Por um instante, aquele encontro aparentava uma incrível coincidência para mim. Dois cegos esperando por algo, ou alguém.
Então, já concentrado neste caso, resolvi assistir o final da história.
O jovem “olhou” para o lado, onde a jovem se encontrava, e foi se aproximando dela, sem hesitar. Ele tocou em seu ombro, fazendo-a se virar para ele, e eles se abraçaram por alguns segundos. Ele sussurrou algumas palavras no ouvido dela, que abriu um largo sorriso e então saíram de mãos dadas, em direção às escadas que dão acesso ao metrô, sem a ajuda de ninguém.
Fiquei impressionado com o que havia acabado de testemunhar. Um jovem cego marcou um encontro com sua jovem namorada, também cega. Eles ficaram uns instantes um ao lado do outro, sem se notarem. Passados esses instantes, o jovem sentiu a presença de sua namorada, imagino eu que pelo cheiro, e foi em direção dela sem ter nenhuma dúvida de que era ela.
Ele a notou, ele a percebeu. Ele não a viu com seus olhos. Ele não podia. Mas de alguma forma ele a enxergou completamente.
14/06/2009
Carta ao jovem vocacionado
Amigo (a)
Escrevo esta carta após perceber que muitos vocacionados para o trabalho cristão escapam da corrente por inúmeros buracos no encanamento e não chegam, afinal, a desempenhar com integralidade sua vocação ministerial.
Talvez você seja um jovem vocacionado. Talvez você sinta o seu coração arder ao falar em missões, talvez você esteja numa Universidade e queira dedicar a sua vida e seus estudos para a causa do Reino. Você também pode ser um profissional e sinta que Deus o quer em outra direção, ou mesmo, talvez você seja um músico que queira dedicar seu talento para levar a igreja à adoração através de novos cânticos autorais. Se você ouve em seu coração o “segue-me” de Jesus, mas se encontra perdido, sem saber para onde ir, estas palavras são para você.
Estes não são conselhos práticos, pois a praticidade é ordinária e Deus costuma trabalhar com aqueles a quem chama de modo extraordinário. São 3 conselhos que, antes de ajudar você a seguir adiante, devem auxiliar a ser mais objetivo na oração.
Assim, para seguir o chamado de Cristo devemos:
Desprender: quando Cristo chamou os seus discípulos para que o seguissem, Ele estava indo para longe: longe de sonhos individuais, longe da realização das expectativas que a família e os outros colocaram sobre os discípulos, do conforto da terra e do lar, longe das riquezas e das alegrias fugazes. Ele estava chamando seus discípulos para perto de Si com exclusividade e isso exigia que os discípulos de desprendessem de tudo o que estivesse preso aos seus corações.
Seguir a Cristo significa deixar a sua terra, desprender-se de tudo para receber tudo de Deus. Quais os seus medos, quais as suas barreiras, o que o impede de fazer qualquer coisa, ir a qualquer lugar, sofrer qualquer tormento em nome dAquele que nos tirou das trevas e nos trouxe para a sua maravilhosa luz? Força e confiança em Deus nos amoldam a qualquer destes buracos.
Seguir a Deus é render-se e dizer: “tá legal Deus, topo qualquer parada!”.
Aprender: quando Cristo chamou os seus discípulos para que o seguissem, Ele os estava chamando para o discipulado. Ele os estava chamando para ficarem com os rostos sujos da poeira de seus pés, para Ele trabalhar o caráter deles. Ele está chamando você para o batismo com fogo: etapa doída, demorada, que custa caro e leva tempo, pois antes de nos convocar para o campo, Deus nos coloca no banco.
Reconhecer que devemos aprender só é possível pela humildade e paciência. A etapa do aprendizado é o tempo em que nossos rostos ficam tanto tempo expostos à Palavra de Deus que saímos de casa com o rosto iluminado. É o tempo de aprender a articular a Palavra de Deus. Para isso, há muitos cursos teológicos, institutos bíblicos, seminários, cursos por correspondência. É também um tempo para você conhecer mais sobre sua vocação, seja fazendo um curso universitário, um técnico; conhecer outros como você, seja missionários, músicos, advogados cristãos; conhecer as organizações que trabalham com o que você é chamado para fazer, ler revistas, livros etc. É o tempo para a formação de um servo de Deus.
Empreender: Depois que Jesus disse “siga-me”, Ele disse “ide por todo o mundo”, sem especificar local, generalizando com algo como “aonde precisarem de Mim”. A vocação nos faz ir já para a terra que ainda Deus mostrará. O ir começa na disposição do seu coração e termina no avanço do Reino. O ir não é direção, mas movimento: pode ser voltar, pode ser ficar, mas deve-se fazer, empreender para a causa celestial, motivado em Cristo, capacitado pelo Espírito, para a Glória de Deus e avanço do Reino. A etapa do empreendimento já não é feita por garotos e garotas, mas por homens e mulheres de verdade, amadurecidos na Palavra, e o que eles ouvem já não é somente o “segue-me”, mas o revigorante e inspirador: vai nesta tua força, porventura não te enviei eu? Sê forte e corajoso. Porque quando Deus nos convida para segui-lo, Ele quer mudar o rumo da história.
Finalizo encorajando você a permanecer firme em sua vocação, certo de que é a melhor direção da vida, e convidando-o a orar por força e confiança para desprender-se de tudo o que não é Cristo; humildade e paciência para o tempo de aprendizado; e coragem para empreender na vocação.
Atenciosamente,
André Filipe, Aefe!
08/06/2009
Missão Integral
Extraído da mesa redonda do Fórum Jovem de Missão Integral - 2007
Pergunta dirigida à mesa: Dentro da compreensão de missão integral, geralmente se fala sobre a questão do pobre e do excluído. Mas é possível a gente, como igreja, também ter uma abordagem em relação àqueles que são ricos ou que não são excluídos ou não são pobres? Isto ainda é missão integral uma vez que aquelas pessoas são pobres, são excluídas mas todo este sistema de opressão ele, de certa forma, é feito uma manutenção dele por meio de pessoas que detém o poder e detém o dinheiro?
Resposta do pastor Ed René Kivitz:
Eu me aventuro na resposta.
E acho a pergunta extremamente inteligente e relevante pra nós estabelecermos alguns critérios básicos aqui nesse Fórum de Missão Integral.
Porque ela é uma pergunta que afeta diretamente nosso conceito de evangelização. E de alguma forma nós herdamos um conceito de evangelização onde a evangelização é o anúncio de uma mensagem. E com todo respeito aos nossos irmãos, uma mensagem que foi traduzida em quatro leis espirituais.
Evangelizar, para nós, é sinônimo de evangelismo pessoal. Evangelizar, para nós, é sinônimo de oferta de uma salvação individual, pós-morte, onde você começa dizendo que o camarada é pecador, mas que Deus o ama, tem um propósito para vida dele e se ele aceitar Jesus como salvador pessoal ele vai pro céu. Isso é evangelizar. Entretanto, este conceito de evangelização é absolutamente estranho às páginas da Bíblia Sagrada e do Novo Testamento. Porque evangelizar é não anunciar uma mensagem, mas é anunciar a chegada de uma realidade: o Reino de Deus chegou e o Rei chegou junto com ele. Ou: o Rei chegou e se o Rei chegou o Reino chegou junto com Ele.
Evangelizar é levar ao homem integral nas suas relações integrais com a existência a realidade do Reino de Deus e não uma mensagem. É levar o Reino. É dizer ao ser humano coletivo, ao ser humano em coletividade: o Reino de Deus chegou!
Quando eu anuncio isso, para o pobre é uma boa nova, para o rico é uma péssima nova. Para o pobre é “Ah! Então chegou o Rei Justo! Que vai promover a Justiça! Que vai trazer a Paz! Que vai trazer reconciliação! Que vai olhar para aquele que está oprimido! Que vai trazer libertação! Que vai trazer a cura nas suas asas! Ah! Chegou o Rei?”. Chegou! “Chegou o Rei que vai destronar os poderosos? Chegou o Rei que vai derrubar os altivos? Chegou o Rei que vai promover definitivamente a vontade de Deus na Terra como ela é feita no céu?” Ahh, para alguns isso é uma péssima notícia.
Por isso é que quando os discípulos de João Batista perguntam: “És tu aquele que havíamos de esperar?”. Jesus responde: “Voltem e digam a João Batista o que é que vocês estão VENDO”.
Porque a chegada do evangelho, da boa nova, é a chegada do Reino. E o Reino não é uma coisa que a gente escuta a respeito; o Reino é uma coisa que a gente vê. E Jesus disse assim: “Voltem e anunciem o que vocês estão VENDO!”.
O Rei chegou! Os aleijados andam, os cegos vêem, os leprosos são purificados, os presos são libertos e aos pobres é anunciado a boa notícia. É a notícia do ano aceitável do senhor, o ano das dívidas perdoadas. Os credores não gostam desta notícia; só os devedores gostam desta notícia.
Por isso, a missão integral não é o que o Ari (Ariovaldo Ramos) estava falando ontem à noite. Não se confunda missão integral com cesta básica e ação social. A missão integral é levar o evangelho todo para o homem todo. O homem em suas circunstâncias. É anunciar a chegada do Reino de Deus; isto é evangelizar. E demonstrar com palavras e obras que esse Reino está presente.
Nesse sentido, ao pobre é promover a sua libertação, é promover a sua dignidade humana, é promover a sua condição de ser criado a imagem e semelhança de Deus. E ao rico, é convidá-lo a converter-se à Justiça do Reino; que em termos práticos é converter-se ao pobre e a causa do pobre. Não é convidar o rico pra deixar de ser rico, é convidar o rico pra que ele manipule a riqueza não como se fosse sua, mas como uma riqueza que pertence a Deus e, portanto, pertence a todos e não somente a ele, rico.
Então você está certo porque essa sua pergunta nos ajuda a corrigir uma possível distorção: que missão integral é a mobilização da igreja na direção ao pobre. Não, missão integral é a mobilização da igreja para que ela seja uma evidência, um sinal histórico de que o Reino de Deus está presente e que diante deste Reino presente o pobre tem um posicionamento a assumir e o rico tem um posicionamento a assumir. Um posicionamento ao Rei e ao Reino que Ele trouxe.