OBS.4s: observações quadradas para um mundo redondo sobre um Deus triúno!

12/04/2012

Abril de 1521


André Filipe, Aefe!
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O eco da voz do juiz representante do Império Romano morcegava pelo salão do castelo da cidade de Worms, em que havia mais de 150 reis e delegados intentados a condenar o homem centro do círculo inquisidor. Com sua boina escura, Martinho Lutero estava feliz, e nada o intimidaria. Ele que há anos contrariava um monstruoso poderio religioso. Era abril de 1521.
- Estas são suas obras? – perguntou o juiz disposto a humilhá-lo.
O juiz consumia o monge, vigiado pelo Imperador Carlos V e pelo Papa Leão X. A intenção era fazer Lutero negar seu ideal cristão que desafiava a doutrina Romana.
Ao ouvir o acusador, Lutero sorria, pois naquele momento lembrava-se de sua vida. Lembrou-se de dias atrás quando Filipe Melanchton entrou em sua casa para alertá-lo sobre o julgamento.
- Todo o povo comenta que a Assembléia é para matá-lo… – alertou ele.
- Não podem matá-lo – retrucou Micônio – deram um salvo-conduto para ele.
Lucas Cranach, que saboreava um vinho quente na casa, lembrou:
- Também deram um salvo-conduto a João Huss antes de o queimarem vivo.
Lutero ria-se da apreensão dos amigos, acariciando as mãos de Catarina Von Bora, ex-freira com quem Lutero se casou.
Na Assembléia, mais argumentos contra o monge soavam como uma punhalada. Lutero voltou a recordar-se.
Lembrou-se da tempestade que o fizera prometer virar monge, e das impertinentes dúvidas e medos que o perseguiam. Lembrou-se ainda da extrema liberdade sentida quando seus olhos abriram-se ao ler Romanos. O apóstolo Paulo cochichou em seu ouvido naquele momento: “O justo viverá pela fé”.
Lembrou-se então da noite em que escreveu 95 contestações à Igreja e da repercussão não imaginada que elas tiveram. Lembrou-se por isso da festa do dia anterior em que chegara a Worms saldado por uma multidão tamanha de fiéis em Cristo dispostos a ouvi-lo, que teve de subir na torre da igreja para pregar, já que as igrejas protestantes não comportavam mais tanta gente.
- Viva Lutero! – saldavam as pessoas das janelas de suas casas – Que Deus o proteja!
Lutero lembrou-se da emoção sentida quando, de cima da torre da igreja, cantou o hino que escrevera a dois amigos mortos pela inquisição. Das primeiras palavras de “Castelo Forte”, toda a multidão o acompanhou até o fim do hino, num vozerio tão apaixonado e tão forte, que a Europa chorou de alegria e Deus fortificou Lutero de tal maneira que ele sentiria gosto de morrer pela verdade.
- Responda! – gritou o juiz – Estás disposto a abandonar as mentiras por ti pregadas?
Martinho levantou-se calmamente e passeou uma vez para frente, sorrindo.
O silêncio feroz calou uma multidão de homens romanos que estavam lá para maltratar Lutero com palavras, e calou, de um outro lado, as canções de apoio dos cem cavaleiros negros, fiéis luteranos, que o acompanhavam naquela assembléia. A vida curta do silêncio paragrafou a história cristã, quando Martinho respondeu:
- Uma vez que vossa majestade solicita uma resposta simples, devo dá-la, sem restrições e sem rodeios. A não ser que eu seja condenado pelo testemunho das Escrituras ou da simples razão, pois não creio no papa ou em concílios, uma vez que se sabe que eles erram e se contradizem com frequência, estou preso às Escrituras que citei e minha consciência é escrava da Palavra de Deus. Não posso nem quero revogar nada, pois não é seguro nem honesto agir contra a própria consciência. Aqui estou, não posso fazer diferente.
A resposta entalou a garganta suja dos opositores e encheu de orgulho o coração dos cavaleiros. Ao lado de Martinho, Deus estava presente na Assembléia, e o acompanhou quando saiu triunfante do castelo, orgulhoso de cumprir o papel que Deus havia lhe posto.
Ao passar pelos amigos, um respeito profundo tocou cada um dos luteranos, que espontaneamente retiraram suas espadas das bainhas e as expuseram ao alto, e o enlatar do metal, o brilho e a glória do momento, agradeceram ao monge sua fidelidade.
Partilharam de muita alegria os amigos de Lutero quando terminou a Assembléia. O texto da resposta de Lutero circulou já no outro dia em Worms.
Após a Assembléia, Lutero foi banido do Império Romano, seus direitos civis foram caçados, e o salvo-conduto não duraria muito tempo. Qualquer ajuda ou demonstração de afeto com o reformador era crime muito bem castigado.
No negro da noite em que retornava a Winttemberg, Lutero, junto de dois amigos, viajava clandestinamente por um bosque, abaixo dos brilhos de uma tempestade. Lutero orou a Deus, mas sentia-se sozinho. Ao terminar a oração, o estranho som de diversos cavalos se aproximando amedrontaram os amigos do reformador.
- São eles! – gritou um – vão nos matar.
Pareciam muitos. Em meio às árvores e à chuva, Lutero via em relances cavalos com seus cavaleiros, e ouviu o desembainhar de espadas, os gritos de terror, gritos de morte. Lutero achou-se sozinho, indefeso, seus amigos haviam fugido. Quatro cavalos o cercaram. A chuva caía-lhe no rosto e uma carroça veloz quase não parou em sua frente. Abriu-se uma porta e uma mão com uma espada saiu dela.
Lembrou-se por fim do hino que cantara com a multidão: “Se tudo se acabar/e a morte enfim chegar,/com Ele reinaremos.” E Martinho Lutero sentiu paz novamente.
A outra mão saiu da carroça oferecendo ajuda e só então Lutero percebeu por detrás do capuz o rosto pacífico do amigo Filipe, que o colocou para dentro às pressas, para salvá-lo das emboscadas dos guerreiros romanos. Dentro estavam Catarina, Filipe, Lucas, Micônio e outros velhos amigos, que o levaram ao Castelo de Wartburg onde se refugiou por dois anos.
Foi neste castelo em que comandou com muita fé o movimento protestante que ganhou o mundo e reformou a igreja, fazendo-a retornar às Escrituras.

Um comentário:

Alcides Barbosa de Amorim disse...

Muito bom ler estas informações em dias que antecedem os 499 anos da Reforma! Obrigado!