OBS.4s: observações quadradas para um mundo redondo sobre um Deus triúno!

11/08/2008

Meu ensaio sobre a cegueira



diante da dor dos outros

Há duas semanas, fui ao pronto-socorro acompanhar uma amiga que havia machucado o pé: somente um pequeno roxo que tinha trazido preocupação. Quando chegamos, tivemos de enfrentar uma fila que me atrasou a vida. Já quase uma hora sentado esperando ser atendido, entrou na sala uma mulher de uns 40/50 anos, numa maca, com um lamento cansado e desesperado de dor. Devia ser uma terrível dor nas costas, tanta que impedia ela de andar.

Uma mulher chorando muito guiava a maca, parecia ser a filha da convalescente. Via-se no rosto dela o sofrimento pela dor da mãe. Todavia, ninguém ao redor alterou a expressão do rosto com a chegada das duas. Todos indiferentes àquela cena e preocupados com o próprio atendimento. Quando apareceu um médico, a filha apressou-se em seu desespero e implorou para ser atendida. O médico atendeu, então. Lembro-me de ter pensado por um momento: puxa, era nossa vez...

Pensei no sacerdote e no levita da parábola do samaritano e, sabe de uma coisa, hoje tenho dificuldade em julgá-los. Percebo cada vez mais que, desde a queda do homem, acredito, um fio invisível se cortou entre os seres humanos que impede todos nós de nos compadecermos verdadeiramente por alguém que não temos uma relação muito forte. Fico pensando, que laço envolvia aquelas duas mulheres, que não nos envolvia naquela fila? O que tinha aquela filha por aquela mulher compadecida que faltou a todos nós? Porque nos compadecemos mais por uma prova que vamos mal, que a morte de milhões em determinado terremoto ou numa guerra?

Algo foi cortado entre os homens quando entrou o pecado nosso, e esse algo nos impede e nos impedirá até o fim dos tempos de nos compadecermos verdadeiramente de um desconhecido. O evangelho relata que o sacerdote e o levita viram, e passaram de largo1. Eles viram, mas continuaram cegos à dor alheia. O que faltou ao levita e ao sacerdote, mas que não faltou ao samaritano, e isso fez toda a diferença na vida do homem caído na estrada, foi ver e compadecer-se2, assim relata o evangelista. Ele viu além, ele viu com o coração.

No êxodo, o autor descreve esta relação de Deus com seu povo: Deus viu, e se compadeceu3. No evangelho, o evangelista retrata este drama de Jesus: Ele viu, e se compadeceu4. Esta talvez seja a mais extraordinária ação de Deus e que nunca vamos compreender de verdade, pois Deus viu a humanidade, e resolveu se compadecer daqueles que mais sofriam. Ele resolveu tomar a posição da filha naquele hospital. Em determinado momento da eternidade, Deus viu aquele nosso sofrimento especial por enfrentar este mundo marcado pelo maligno, e numa atitude verdadeiramente altruísta, resolver doer-se conosco. Por isso, acho que a Cruz não foi o maior sofrimento de Jesus. A Cruz foi o grande alívio de Deus. A Cruz foi o momento de Jesus implorar por nosso atendimento, e o momento de Deus dizer: você já está sendo atendido, logo logo vai passar.

Somente quando acabar para sempre esta cegueira que nos impede de ver e se compadecer, vamos compreender o tamanho e a profundidade da dor de um Deus, de um homem, por toda uma humanidade de desgraçados.

1 Lc. 10. 31 e 32.
2 Lc. 10. 33.
3 Ex. 2. 23-25 e Ex. 3. 7-9.
4 Mt. 9.36.

6 comentários:

Cristiano Silva disse...

Se já naquela época da parábola do samaritano, Cristo já evidenciava a falta de amor ao próximo, imagine hoje então, onde, segundo penso, vivemos na época em que Jesus profeticamente disse que "o amor se esfriará de quase todos".

O grande ensinamento da parábola, para mim, é que o amor é um exercício que não devemos largar de praticar nunca, à despeito do mundo à nossa volta. Mas é difícil mesmo: na época em que vivemos, e num país tão desigual quanto o nosso (onde banaliza-se a violência e a miséria) é muito fácil sermos céticos pessimistas com o coração duro.

(Ensaio Sobre a Cegueira é um ótimo livro... pretendo ler agora o Ensaio Sobre a Lucidez)

Abraços.

Unknown disse...

Ensaio sobre a cegueira, do saramago, mostrou-me o estado humano d forma muito clara. O mais bonito de tudo é que eles voltam a ver qdo voltam à comunhão... O Saramago é um ateu sm-vergonha, mas revelou uma façanha sobre o pecado humano!

Agora, Cristiano, espero que não se decpcione com o Ensaio sobre a lucidez... dizem que ficou muito aquém de seus livros...

Abraço e fica com Deus

Cristiano Silva disse...

Parece que ele gostou muito da adaptação que o Meireles fez do livro. Até chorou de emoção.

E não me conformo até hoje: as gravações eram literalmente ao lado da minha casa, a Julianne Moore estava lá, e eu só fui saber quando eles estavam indo embora!!!

Espero que o Lucidez não seja tão ruim assim... outro que li dele foi o Intermitências da Morte, e é ótimo.

God bless.

Unknown disse...

Olá Pri,

muito obrigado pelo comentário.
Na verdade, comecei a ler o livro e precisei deixá-lo. Mas impactou-me muito também. Teve horas que tive vontade de jogá-lo contra a parede. Na semana passada voltei a lê-lo, estou quase no final, e sabe, a série de cenas na casa do médico foi mesmo emocionante demais! Parece até que um cristão escreveu. A celebração da ceia, e quandos eles lavam as roupas, e as três graças tomando banho na varanda. Tudo muito bonito e simbólico...

Ah, Cristiano,tbém aguardo com expectativa o filme e fiquei triste de perder as gravações...

Julia disse...

Vou me intrometer com todo respeito... eu nao acredito em natureza pecaminosa, acho que o homem escolhe ser egoista porque quer msm, sem ajuda de um diabo ou nao... enquanto dermos essa desculpa esfarrapa que nós mesmo criamos, estaremos perdidos.. Deus nao pode miudar algo assim na glorificaçao após sua volta pregada na Biblia, pra mim nao há nada na carne que impeça de amar e nao escolher só por si. nem na mente nem na carne, e se ha alguma tendencia má, ela foi deturpada pela propia pessoa, pois tenho certeza que nascemos perfeitos e escolhemos amar ou nao desde que nascemos. descordem, nunca vi alguem admiti isso msm. bjos.

Unknown disse...

Prezada Júlia,

espero que leia este comentário.

Bom, na verdade, eu também preferiria que não houvesse natureza pecaminosa, e que nós tivéssemos esta tal liberdade. Aliás, também tenho uma primeira dificuldade em aceitar esta doutrina. O problema é que é isso que a Bíblia nos diz.

A questão do pecado não é uma coisa que nós inventamos e não tem muito a ver com o diabo, mas sim com a soberania de Deus, pois cremos que nada do que façamos foge ao seu controle. Se temos a liberdade de ofendê-lo, então ele perdeu o controle da humanidade.
Quando não pecamos, no entanto, não é mérito nosso, pois não podemos escolher não pecar, pois nossa natureza é rebelde a Deus, mas a santificação é algo que chamamos de graça, um belíssimo presente de Deus, que nos faz "enxergar" a vida segundo a Palavra de Deus.

Mas creio que tudo isso está entrando por um ouvido e saindo por outro, não é?
Dei uma olhada no seu blog e fiquei bastante curioso e interessado em prolongar o assunto.
A bem pouco tempo atrás estava com as mesmas dúvidas (ou certezas) a respeito da inspiração da Bíblia. Tenho certeza que meus argumentos contra a inspiração são mais fortes que os seus rsrsrs. No entanto, Deus teve misericórida de mim, e hoje a Bíblia é a coisa mas valiosa do mundo para mim.

Se pudermos trocar figurinhas, e passar esta minha experiência, ficarei muito feliz.

Meu nome é André Filipe, e meu email é: def_ipi@yahoo.com.br
Mande suas teses e antíteses, rsrss contra a inspiração, e conversamos.

Grande abraço e obrigado pela visita.